...Às vezes dá-me p`a ler outras pra escrever, às vezes dá-me p`ouvir outras pra cantar, às vezes dá-me p`a rir outras p`a chorar... Eis que apenas "eu" e os "outros" vivemos no mesmo mundo, não assim tão longe...

31/01/2010

o amor, um dever de passagem



Fui envenenado pela dor obscura do Futuro.
Eu sabia já que algo se preparava contra o meu corpo.
Agora torço-me de agonia  nos versos deste poema.

Esta é a terra outrora fértil que os meus dedos dilaceram.
Os meus lábios são feitos desta terra, são lama quente.
Vou partir pelo teu rosto para mais longe.

A minha fome é ter-te olhado e estar cego.
Agora eu sei que te abres para o fogo do relâmpago.
Tenho a convicção dos temporais.

Já não sei nem o que digo nem o que isso importa.
Guia dos meus cabelos rasos, da melancolia, da vida efémera dos gestos.
Nesse dia fui melhor actor do que a minha sinceridade.

A cesura enerva-me no estômago
Cortei de manhã as pontas dos dedos mas sei já que elas crescerão de novo a proteger as unhas.
Talvez a vida seja estranha, talvez a vida seja simples, talvez a vida seja outra vida.

A linha branca da Beleza é a minha atitude que se transforma.
A violência do sono sobe sobre o meu conhecimento.
Fui algures um horizonte na secessão das pálpebras.

Nuno Júdice, in "O Pavão Sonoro"

26/01/2010

A Perturbação do Último Acontecimento


...se podia amar-te amanhã, como amava ontem? ... podia... mas não seria a mesma coisa...

"A vida de uma pessoa consiste num conjunto de acontecimentos no qual o último poderia mesmo mudar o sentido de todo o conjunto, não porque conte mais do que os precedentes mas porque, uma vez incluídos na vida, os acontecimentos dispõem-se segundo uma ordem que não é cronológica mas que corresponde a uma arquitectura interna. Uma pessoa, por exemplo, lê na idade madura um livro importante para ela, que a faz dizer: "Como poderia viver sem o ter lido!" e ainda: "Que pena não o ter lido quando era jovem!". Pois bem, estas afirmações não fazem muito sentido, sobretudo a segunda, porque a partir do momento em que ela leu aquele livro, a sua vida torna-se a vida de uma pessoa que leu aquele livro, e pouco importa que o tenha lido cedo ou tarde, porque até a vida que precede a leitura assume agora uma forma marcada por aquela leitura."
Italo Calvino,
in "Palomar"

20/01/2010

... a acção ...



«A acção só vale quando é feita como um exercício, e um exercício com amor, quando é feita como uma ascese, e uma ascese por amor de que se liberte o Deus que em nós reside. E se a acção implica amargura, o que há a fazer é mudar de campo: porque não é a acção que estará errada, mas nós próprios»

Agostinho da Silva

19/01/2010

...acasos...





Todos os acasos da nossa vida são materiais de que podemos fazer o que quisermos. Quem possui muito espírito faz muito da sua vida - cada tomada de conhecimento, cada acontecimento seria para ele inteiramente espiritual - um primeiro membro de uma série infinita - o início de um romance infinito.
 
Friedrich von Novalis,
in 'Fragmentos'

14/01/2010

... Janeiro ...





"Não chove nem faz sol na minha rua.
É a hora triste. Aquela hora morta

em que uma sombra nos espreita a porta

e pelas frinchas gastas se insinua."

...

Fernanda de Castro

12/01/2010

... a porta ...



Se você abre uma porta, você pode ou não entrar em uma nova sala.
Você pode não entrar e ficar observando a vida. Mas se você vence a dúvida, o temor, e entra, dá um grande passo: nesta sala vive-se! Mas, também, tem um preço... São inúmeras outras portas que você descobre. Às vezes encontram-se mil e uma.
O grande segredo é saber quando e qual porta deve ser aberta.

A vida não é rigorosa, ela propicia erros e acertos.

Os erros podem ser transformados em acertos quando com eles se aprende. Não existe a segurança do acerto eterno. A vida é generosa, a cada sala que se vive, descobre-se tantas outras portas. E a vida enriquece quem se arrisca a abrir novas portas.

Ela privilegia quem descobre seus segredos e generosamente oferece afortunadas portas. Mas a vida também pode ser dura e severa...

Se você não ultrapassar a porta, terá sempre a mesma porta pela frente.

É a repetição perante a criação, é a monotonia monocromática perante a multiplicidade das cores, é a estagnação da vida... Para a vida, as portas não são obstáculos, mas diferentes passagens!
 
Içami B.

06/01/2010

...laços...

...podes vir amanhã...

...a acreditar no mesmo Deus ...




devolve-me os laços

meu amor

03/01/2010

... não ... agora ....



Será que sabes que hoje é domingo,
ou os dias não passam, são anjos
caindo.

Será que me consegues ouvir
ou é tempo que pedes quando tentas
sorrir.



Não partas então, não me deixes
sozinho
{P. Abr - Será}